Não há nenhum planeta-gigante-vermelho vindo em direção a Terra. Se você ouviu essa história em algum lugar, esqueça. É sensacionalismo barato. A verdadeira ameaça vem de rochas muito menores, do tamanho de uma montanha, escuras e difíceis de detectar. Como Apófis (99942 Apophis).
Esse asteroide, que tem cerca de 390 metros, foi anunciando em dezembro de 2004 como tendo uma chance de 2,2% de colidir com a Terra em 13 de abril de 2029. Embora a chance pareça mínima, ele foi o primeiro a atingir o nível 2 da escala de Torino, que classifica o perigo associado a asteroides e cometas (veja abaixo).
Difícil previsão
Atualmente somos capazes de identificar com eficiência asteroides com pelo menos um quilômetro de extensão, embora os menores também sejam perigosos. Determinar se podem nos atingir numa passagem futura, contudo, é sempre um desafio ainda maior.
É que essas “montanhas voadoras” precisam ter suas trajetórias orbitais muito bem determinadas. Somente então faz sentido a aplicação das equações que fornecem suas posições futuras, e que consideram a interação gravitacional com corpos mais massivos nas redondezas, como planetas – o que altera novamente seus rumos, num intrincado trânsito orbital que pode acabar em trombada.
Muitas vezes os astrônomos têm informações apenas sobre um pequeno fragmento orbital, colhido em poucos dias de observação. Refinamentos posteriores geralmente alteram as previsões iniciais. Foi o que aconteceu com Apófis.
Observações de radar extremamente precisas, feitas pelo (hoje extinto) Rádio Observatório de Arecibo, em Porto Rico, em janeiro de 2005, refinaram ainda mais a órbita de Apófis, mostrando que sua passagem em 2029 seria a cerca de 5,6 raios terrestres de nós. Assim mesmo um rasante brm próximo (menos de um décimo da distância da Terra à Lua). Tanto que ele poderá ser visto a olho nu.
Evitando o pior
Na pior das hipóteses ele atingiria a terra na passagem seguinte, em 2036. O mais provável é que não represente uma ameaça, mas ainda assim seria bom que pudéssemos nos precaver de alguma forma. E as propostas já existem.
A Agência Espacial Europeia (ESA) escolheu Apófis e mais outro asteroide para uma operação de desvio de trajetórias orbitais que está sendo chamada de Missão Dom Quixote. O asteroide (10302) 1989 ML, de 600m de diâmetro e cuja órbita fica entre Marte e a Terra, receberá a visita das sondas Sancho e Hidalgo para testar a manobra pela primeira vez.
Hidalgo, homenagem ao cavaleiro errante criado pelo espanhol Miguel de Cervantes, colidirá com o asteroide escolhido, enquanto Sancho, o fiel escudeiro do herói, observará a colisão, documentando a mudança de trajetória.
Os americanos também estudam utilizar um rebocador espacial que atracaria com a superfície do asteroide ameaçador. Um empurrão lento durante uns três meses na direção do seu próprio movimento orbital seria suficiente para resguardar a Terra de um impacto (o aumento da velocidade orbital expande a órbita de um corpo, mudando seu rumo).
Tudo deve ser testado o mais rápido possível – com asteroides conhecidos. Os programas de patrulhamento celeste devem ser ampliados e aperfeiçoados. Somente com antecedência de pelo menos uma década poderemos fazer alguma coisa.
Acertando o alvo
Acabou sendo a Missão DART, da NASA, a primeira dedicada a investigar e demonstrar um método de deflexão de asteroides alterando seu movimento por meio do impacto cinético.
A DART lançou um projétil de 570 kg que colidiu deliberadamente com um asteroide (que não representa ameaça para a Terra) a 11 milhões de quilômetros de distância, alterando sua velocidade e trajetória. Seu alvo foi o sistema binário formado pelo asteroide Didymos, com aproximadamente 780 metros de diâmetro e sua lua Dimorphos, de 160 metros de diâmetro. DART impactou Dimorphos com sucesso, provando a viabilidade dessa estratégia.
Vizinhos perturbados
Via de regra, asteroides não vêm de longe, de fora do nosso sistema planetário. Pelo contrário, a maioria são “habitantes” da parte rasa do Sistema Solar, vagando ao redor do Sol em trajetórias elípticas geralmente internas à órbita de Júpiter.
Eles não são grandes como planetas, mas são muitos. A história geológica da Terra – e a superfície esburacada da Lua – guardam marcas de encontros pouco amigáveis no passado. Hoje não se conhece nenhum cuja colisão com o nosso mundo seja certa. Mas é certo que um dia acontecerá de novo.
Observações realizadas em agosto de 2006 fizeram Apófis passar para zero na Escala de Torino, com uma probabilidade de impacto de 1 em 45 mil em 2036 e de 1 em 150 mil em 2068. A precisão atual da órbita de Apófis é grande, gerando alta confiabilidade nessas previsões.
Os resultados de uma nova campanha de observação de radar, combinada com uma análise precisa da órbita de Apófis ajudaram os astrônomos a concluir que não há risco de um impacto com o nosso planeta por pelo menos um século.
A animação abaixo mostra a trajetória orbital de Apófis conforme ele passa com segurança em 13 de abril de 2029. A gravidade da Terra irá desviar levemente sua trajetória e sua maior aproximação será de 32.000 km da superfície do nosso planeta. O movimento foi acelerado 2.000 vezes. Crédito: NASA/JPL-Caltech.
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