Tudo começou no tempo dos antigos egípcios, cujo calendário consistia de 12 meses com 30 dias cada, mais 5 dias adicionais para completar os 365 que a Terra gasta em seu movimento em torno do Sol. Bem, pelo menos era o que se pensava, quando a duração do ano foi determinada através das variações da sombra produzida por uma estaca fincada verticalmente no solo.
Mas na prática sobram incomodas 5 horas, 48 minutos e 46 segundos até que a Terra volte a um mesmo ponto de sua órbita. Sem a precisão obtida hoje, os egípcios decidiram intercalar 1 dia a mais a cada 4 anos, passando a chamar seu calendário de Alexandrino.
O ano da confusão
Mais tarde, os Romanos tiveram sérios problemas com essas inserções. Particularmente sob o governo de Júlio César, elas foram tão dramaticamente negligenciadas que no ano 46 a diferença atingiu 80 dias.
Então eles fizeram um novo calendário, e para começar o ano 46 teria 445 dias (365 + 80), passando para a história como o “Ano da confusão”.
Conheces as leis dos céus? Poderás estabelecer as suas regras na Terra?
— O Livro de Jó.
Antes das calendas de março
O termo bissexto foi adotado pelos mesmos romanos. Eles também achavam que o ano tinha 365 dias e 6 horas (ou 365,25 dias). Assim, a cada quatro anos as horas excedentes somariam um dia extra de 24 horas, que precisava ser acrescentado ao calendário.
Acontece que, no calendário romano, o dia que representava o início de cada mês era chamado calendas. E o tal dia extra era normalmente inserido após o dia 24 de fevereiro, isto é, 6 dias antes das calendas de março. Como esse dia era contado duas vezes o chamavam de bis sexto ante calendas martii ou, resumidamente, bissexto.
Os romanos fizeram a intercalação do bissexto rigorosamente durante mais de mil anos. E o calendário Juliano, afinal, foi adotado em grande parte do mundo ocidental.
Ano solar verdadeiro
Contudo, o ano solar verdadeiro tem 365,242199 dias – portanto mais curto que o ano Juliano. Ao acrescentar sistematicamente um dia a cada quatro anos durante tanto tempo, o equinócio da primavera acabou “se atrasando” dez dias em relação ao calendário Juliano.
Para a Igreja Católica, isso implicava num acontecimento muito grave: no período compreendido entre a quarta-feira de Cinzas e a Páscoa, comer carne era considerado uma heresia. E como a Páscoa era determinada com base no início da primavera boreal, estava-se comendo carne num período em que o seu consumo era proibido.
Os dias que nunca existiram
Isso deu origem a outra reforma do calendário, imposta durante o pontificado de Gregório XIII, no ano de 1582. Sob orientação do astrônomo Lélio, a reforma Gregoriana do calendário, como ficou conhecida, consistiu no seguinte:
- Retirar dez dias do ano de 1582
- Criar uma nova regra para calcular os anos bissextos
- Limitar a ocorrência da Páscoa
O mais urgente era eliminar aquela desfasagem. Para isso, ficou decidido que em outubro daquele ano, a quinta-feira 4 seria sucedida pela sexta-feira, 15. Dez dias simplesmente “deixaram de existir”, e o equinócio da primavera voltou a coincidir com o dia 21 de março. Simples assim.
Para evitar uma nova propagação de erros, continuar-se-ia acrescentando 1 dia a cada 4 anos, porém, os anos que fossem múltiplos de 100 deixariam de ser bissextos, exceto se também fossem múltiplos de 400. Dessa forma retirava-se 1 dia a cada 100 anos e adicionava-se outro a cada 400 anos (anos centenários como 1500 e 1900 não foram bissextos, mas para os intermediários é suficiente dividir por 4).
A Páscoa nunca mais cairia antes do dia 22 de março, nem depois de 25 de abril.
O ESTRANHO mês de outubro do ano de 1582.
Incômodas frações
Podemos representar o ano solar de 365,242199 dias na forma de frações, assim:
Mas na época da reforma Gregoriana a última parcela também era desconhecida, daí porquê o ano Gregoriano passou a ser definido da seguinte forma:
Repare que ainda resta uma fração a corrigir: 1/3300. Mas essa é fácil, basta lembrar de retirar um dia do calendário a cada 3.300 anos. Existem ainda imprecisões na duração do dia, porém não tão sérias.
É que a Terra gira sobre si mesma em 23 horas e 56 minutos (fora alguns segundos…). Ao fim desse tempo ela torna a fazer face a uma mesma estrela distante. Mas para fazer face ao Sol, que está muito mais perto, nosso planeta precisa girar por mais quatro minutos. Esse novo período, de 24 horas, é o chamado dia solar.
Tempos incertos
Oxalá o universo fosse “habitado” apenas por números inteiros, desaparecendo as subdivisões do dia e do ano terrestre.
Mas a natureza simplesmente ignora as vontades humanas – e aí de nós se ignorarmos suas frações.
No fundo temos sorte dos ciclos naturais não serem exatos. Caso contrário talvez não tivéssemos aprendido tanto com as observações do céu.
E, pensando bem, as órbitas não são mesmo circulares, os planetas não são esferas perfeitas e nós, seres humanos, não somos polígonos… Nem costumamos caminhar em linhas retas.
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