No mundo das celebridades, há sempre aquelas de temperamento explosivo. Mas no reino das estrelas, o termo “explodir” é levado às últimas consequências. Mesmo que para isso o astro tenha que ser realmente grande. E na vida de uma estrela de verdade, tamanho é documento.
Eta Carina é talvez o exemplo mais dramático em toda galáxia. Com entre 80 a 100 vezes a massa do Sol, seu curioso nome faz alusão a constelação a qual pertence, Carina, e a sétima letra do alfabeto grego, eta, designação que serve para indicar que o astro não é exatamente um campeão de brilho.
Mas nem sempre foi assim. Em 1843 essa estrela brilhava tanto quanto Sírius, a mais luminosa do céu, com o agravante de que Sírius está a somente 8,6 anos-luz da Terra, enquanto Eta Carina fica a 7.500 anos-luz.
Supernova
Tanta energia equivale a potência de uma supernova – o nome dado a uma estrela de grande massa que estoura por inteiro, do centro até a superfície, arremessando com violência suas camadas mais externas pelo espaço.
A energia dessa explosão é tão grande que sua luz pode superar uma galáxia inteira! A estrela chama a atenção para si, mas não por muito tempo. Ao súbito aumento de brilho se segue um enfraquecimento, e o que sobra é uma massa gasosa que se infla lentamente.
Mas lá, bem no centro daquilo que um dia foi uma estrela orgulhosa de seu tamanho, ainda fica um astro compacto, com míseros dez quilômetros de diâmetro, porém incrivelmente denso – ou então um buraco negro, um objeto infinitamente mais denso e menor, cuja força de gravidade é tão intensa que nem a luz escapa.
Mas não foi isso que aconteceu a Eta Carina. Não se sabe como, mas essa estrela sobreviveu a própria explosão. Duas enormes conchas de poeira surgiram, com matéria suficiente para formar mil planetas iguais aos do Sistema Solar. Uma estrutura em forma de ampulheta que fica 600 quilômetros maior a cada segundo.
Duas caras
Mas os astrônomos não acreditam que Eta Carina explodiu de fato. Eles chamam o evento de 1843 de a “grande erupção”. Notaram também que depois daquele ano ela foi enfraquecendo lentamente, até que em meados do século XX voltou a aumentar de brilho – mas só um pouquinho.
Hoje é visível a olho nu somente em noites sem luar, longe dos centros urbanos. Ainda assim melhor que há 50 anos, quando era preciso um telescópio. E como para toda celebridade que se preze, não faltam especulações sobre a natureza de sua variabilidade.
PARA ENCONTRAR Eta Carina você deve olhar na direção do Cruzeiro do Sul. Trace uma linha imaginária que parte de Alfa do Centauro e passa por Alfa do Cruzeiro (Acrux) até encontrar a nebulosa de Carina. Daí você precisará de um bom binóculo e uma noite límpida, sem poluição luminosa, para vislumbrar uma das estrelas mais poderosas da galáxia.
Já se acreditou que Eta Carina era uma supernova lenta, preguiçosa até mesmo para explodir. Ou simplesmente uma estrela “comum” (um pouco acima do peso, é verdade) com instabilidades atmosféricas – uma espécie de pressão alta que levaria a ataques perigosos.
Mas foi um astrônomo brasileiro quem sugeriu que Eta Carina teria uma companheira quente. As interações com ela seriam responsáveis pelas mudanças de brilho. Mas não pelas grandes erupções, que ainda são um mistério. É como se Eta Carina tivesse dupla personalidade.
Cor | Classe espectral | Distância (anos-luz) | Luminosidade (Sol=1) | Massa (Sol=1) | Temperatura superficial (K) | Idade (milhões de anos) |
---|---|---|---|---|---|---|
Azulada | B0 I0 | 7.500 | 5.000.000 | 70 + 30 | 16.000 + 30.000 | 2,8 |
Esperando a vez
A natureza dupla de Eta Carina não é mais uma suposição. Embora, pelo que sabemos de estrelas tão grandes, ela nem deveria existir – mas existe. Ou não mais. Como sua luz nos fornece uma imagem de 7.500 anos atrás, Eta Carina já pode ter explodido e só saberemos quando o brilho dessa explosão chegar aqui.
E que brilho! Se um dia observamos Eta Carina como supernova, estima-se que sua luz será tão intensa a ponto dela aparecer em pleno dia, e a noite suficientemente luminosa para se ler um livro.
A Lua ficaria envergonhada – e seria muito bom que ficasse somente nisso. É que uma estrela assim tão maciça também pode se transformar numa hipernova, um evento muito mais energético e que, pela distância de Eta Carina, poderia afetar a biosfera da Terra de modo imprevisível.
Mas o que podemos fazer se a mau humor dessa estrela realmente se voltar contra nós no futuro? Absolutamente nada. Se tiver de acontecer, assim será. Assim como algumas grandes personalidades da Terra não caíram sozinhas, a estrela mais luminosa da galáxia pode guardar seu último suspiro para seus admiradores. E não há como deixar de admirá-la também por isso.
+ Buracos negros
+ Eta Carina (IAG-USP)