Imagine a situação: você mudou para um apartamento novo, mas ele ainda não está pronto. Alguns cômodos de sua nova morada ainda estão em obras e, uma vez ou outra, quando você desce de elevador até o subsolo, se depara com obras na fundação do prédio!
Parece um pesadelo para qualquer dona de casa, mas também pode ser visto como o dia-a-dia de um engenheiro civil, que “pula” de obra em obra, verificando o acabamento de um prédio, as fundações de outro. Para ele ”é o paraíso”. É a “casa” em que ele vive todos os dias. É o seu trabalho.
Outro tipo de “engenheiro civil” é o cientista. Ele mora num edifício inacabado chamado Ciência. Sua “casa” não está pronta, nem nunca estará, pois nenhuma Ciência é acabada. E de vez em quando algum colega de profissão surge com uma proposta que pode alterar alguns alicerces desse prédio.
É como um edifício em perene construção.
O papel da Ciência
Para muitos de nós isso é incômodo. Desconfortável. Queremos que a Ciência traga respostas, produza verdades absolutas. A razão deve ser imutável, inquestionável. Mas o prédio que está acabado, onde não há nada mais a fazer e cujas colunas de apoio não podem sequer serem pintadas de outra cor fica ao lado – e se chama dogma.
É verdade que a própria Ciência tem seus dogmas – e também é moralmente ambígua. Mas aqui, a autoridade de um argumento é maior que o argumento de uma autoridade. De fato, não há autoridades na Ciência, quando muito, especialistas.
Veja o caso da Astronomia. O principal palco de estudo dos astrônomos, o céu acima de nossas cabeças, está ao alcance de qualquer um. E mesmo sem trabalhar em grandes observatórios, pertence aos amadores um número importante de descobertas, bem como a maior parte da responsabilidade da divulgação científica.
O estado atual da Ciência é sempre provisório. Frequentemente são testadas hipóteses, e sempre que necessário um assunto pode ser revisado e podem surgir novas hipóteses – desde que fruto de dados experimentais ou novas observações.
O papel da Ciência não é produzir verdades absolutas ou inquestionáveis, mas criar a faculdade do entendimento, o senso crítico que nos ajuda a enxergar a natureza como ela é – e não como gostaríamos que fosse. A Ciência é como uma ferramenta que pode nos ajudar a tirar conclusões a respeito de nossas observações do Universo. Porém, essas conclusões não têm que ser definitivas.
Usando o cérebro
Ciência não é difícil de ensinar, nem de aprender. Nascemos cientistas. Curiosos pelo Universo que nos rodeia e fazendo perguntas sobre tudo. Temos mais perguntas que respostas. E nossas perguntas nunca – jamais – são tolas.
Crianças inteligentes são um grande recurso natural do planeta Terra. Só falta lhes proporcionar as ferramentas essenciais para que pensem, para que busquem suas respostas baseadas em raciocino, não em dogmas.
Um mero estímulo não é suficiente. Quando encontramos uma resposta, mesmo parcial, mas por esforço próprio, jamais nos esquecemos dessa alegria, ainda que tenhamos sido o último a saber.
O júbilo da descoberta nos impulsiona naturalmente a fazer novas perguntas. A Ciência não é “chata”, nem está fechada ao fantástico, ao inesperado. Só que se um dia alguém disser que há um dragão morando na garagem do prédio da Ciência, terá de responder satisfatoriamente à sabatina dos moradores sobre sua hipótese – ainda que o dragão seja invisível.
É que mesmo existindo muito mais perguntas que respostas, hipóteses extraordinárias exigem evidências extraordinárias. Para seus moradores, usar o cérebro é um hábito – e eles nunca se sentem desconfortáveis por estarem vivendo no edifício inacabado da Ciência.
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